Fundadora do projeto Mães às Claras
Alguma amiga a lutar contra a infertilidade? Não deixes que o medo de dizer a coisa errada te impeça de ser uma boa amiga. Saber simplesmente ouvir é um dos presentes mais poderosos que tu lhe podes dar.
Conversas sobre tratamentos de fertilidade e sobre infertilidade em geral são sempre difíceis e desconfortáveis. Queremos apoiar, mas temos receio de que, ao tentar ajudar, estejamos na realidade a piorar a situação.
De acordo com a Fertility Europe, mais de 25 milhões de pessoas na Europa lidam com a infertilidade.
Em Portugal, um estudo recente revelou que 9% a 10% por cento dos casais portugueses são inférteis. Por outras palavras, aproximadamente 1 em cada 10 pessoas. São cerca de 290 mil.
Além disso, nos últimos anos tem-se assistido a uma queda de fertilidade de cerca de 50%.
Mas nem tudo são más notícias! Mais de 100 mil desses casos podem beneficiar de tratamento para solucionar o problema.
Estatísticas aparte, o facto é que, quer estejas ciente disso quer não, há uma forte possibilidade de que alguém que tu adoras e que faz parte do teu círculo próximo possa estar a sofrer silenciosamente com a infertilidade.
Então, e o que podemos fazer para apoiar esses amigos?
Antes de mais, cada pessoa é única e singular e por isso é normal que lidem com problemas idênticos de formas completamente diferentes. Por outro lado, as próprias experiências e problemas relacionados com a infertilidade também podem ser muito diversificados.
Como tal, não existe uma “coisa certa” universal que devemos dizer ou fazer, mas existem alguns princípios gerais orientadores que devem estar sempre presentes.
Para te ajudar (e me ajudar a mim também, porque também eu precisava de ler isto), neste artigo reuni alguns exemplos partilhados por especialistas.
Conteúdo
Como podemos ajudar?
1. O que dizer
Em linhas gerais, pergunta se estão bem. Pergunta como os podes apoiar. Valida a sua dor. Ajuda saber que alguém está a pensar neles quando estão a passar por dificuldades. Se não se quiserem abrir, não os pressiones. E lembra-te de perguntares apenas se tiveres efetivamente tempo para os ouvir.
Exemplos concretos:
“Como estás?”
Simples, mas que permite à tua amiga saber que tu estás a pensar nela. Abres a porta, crias o espaço para que, se assim o quiser, ela possa direcionar o tópico da conversa. Se estiver disponível ou a precisar de partilhar alguma má notícia (por exemplo, mais um resultado negativo num teste), terá aqui o seu espaço e tempo para o poder fazer.
Se simplesmente não lhe apetecer falar sobre o tema, pode simplesmente manter aquela conversa superficial e dizer algo como “Estou bem, obrigada. E tu?”. Mas com esta simples pergunta, deixas a porta aberta para ela se poder abrir e desabafar.
“Estou aqui para ti se quiseres conversar.”
Pode-te parecer demasiado óbvio, mas certifica-te de que a tua amiga sabe que tu és um porto seguro, com quem ela poderá contar, sempre que precisar.
A experiência de tratamentos de infertilidade pode ser muito pesada e desgastante, e ninguém quer sentir que está a sobrecarregar os outros ao falar sobre isso.
Dar sinal verde à tua amiga para trazer as suas emoções e falar abertamente sobre as novidades do processo, ao mesmo tempo que demonstras uma atitude de escuta ativa, pode fazer uma enorme diferença no seu estado mental.
Não conheço ninguém que não tem filhos porque se “esqueceu” de discutir essa possibilidade. Não é um tema que se esquece. Portanto, se a nossa ideia é lançar essas perguntas para funcionar como um lembrete, é só parvo. Se não temos nada para dizer, falemos do tempo, de séries, de futebol!
“Isso é realmente uma m*rda. Sinto muito.”
Quando estamos a tentar engravidar, há uma resposta que muitas mulheres ouvem repetidamente: “Só precisas de relaxar. Para de te preocupar com isso e vais ver que vai acontecer naturalmente.”
Isso não só coloca a culpa da infertilidade diretamente nos ombros da mulher, como se ela estivesse a fazer algo de errado, mas também pode aumentar (ainda mais) a pressão, a ansiedade e a frustração, e desencorajar os casais a procurar assistência médica e ajuda especializada.
Apesar da intenção poder ser a melhor, isto pode incentivar a que se olhe apenas para o lado bom, alimentando uma esperança absoluta de que é uma questão de tempo até conseguirem engravidar.
Embora a esperança seja algo necessário, que nunca deve esmorecer, devemos também reservar espaço para a dor que acompanha o território da infertilidade.
Devemos reservar espaço para a incerteza que temos pela frente.
Devemos reservar espaço para confiar e pedir ajuda a equipas especializadas de assistência médica.
Sempre com esperança, mas não só com esperança.
Tem empatia e respeita a sua dor, sem a tentar diminuir ou comparar.
“Estou tão orgulhosa de ti.”
Se a tua amiga optou por procurar tratamentos médicos invasivos, como a fertilização in vitro, para engravidar, tenta não transmitir os teus próprios medos e receios. Em vez de “Oh Meu Deus, que horrível! Não consigo imaginar passar por isso”, tenta animá-los elogiando a sua coragem e resiliência.
Tenta dizer algo como: “Tu estás a enfrentar um enorme desafio para construíres a tua família e estás a fazer isso com tanta força e equilíbrio. És uma inspiração!” Evidencia a força e perseverança que estás a ver neles.
Não deixes que o medo de dizer a coisa errada te impeça de ser uma boa amiga. No final das contas, saber simplesmente ouvir é um dos presentes mais poderosos que tu lhe podes dar.
2. Coloca-te no lugar deles
Se por acaso estiveres grávida ao mesmo tempo que uma amiga está a lidar com a infertilidade, não te sintas culpada. Tens direito a cada pedacinho de alegria que sentes por estares grávida!
A tua amiga? Ela pode estar a sentir mixed feelings, uma combinação confusa de felicidade intensa por ti e alguma inveja.
Tenta dar o teu melhor para estares atenta à sua luta e aos sentimentos dela enquanto preparas e celebras a tua gravidez e o nascimento do teu filho.
Quando começares a anunciar a tua gravidez, não a excluas dessa notícia maravilhosa, com medo de ferires os seus sentimentos. A exclusão pode doer ainda mais do que a notícia.
Em vez disso, opta por partilhar essa notícia com ela em privado – antes de a partilhares com toda a gente – ou envia uma mensagem de texto para lhe contares primeiro. Isto dar-lhes-á tempo para gerirem as suas emoções e dores.
Por exemplo: “Eu sei que estás a passar por um momento difícil a lutar contra a infertilidade. Mas eu preciso de partilhar contigo que estou grávida. Vamos partilhar a notícia da gravidez publicamente, mas eu queria que soubesses com antecedência para que possas ter algum tempo para processares as tuas emoções.”
Ao fazê-lo, também estás a mostrar que respeitas a situação deles. Tens todo o direito a ficar extremamente feliz com a notícia da tua gravidez, mas isso também mostra empatia pela situação deles. Entende que eles estão felizes por ti, apenas tristes por eles.
Não a excluas de nada. Mas certifica-te de que a deixas sempre à vontade para que ela possa recusar o convite, sempre que assim o deseje.
Por exemplo: “Se não te sentires confortável a ir ao baby shower, não te sintas obrigada. Claro que eu adoraria ter-te lá, mas se precisares de faltar ou de sair mais cedo, eu entendo completamente. Por favor, faz o que for preciso para te protegeres.”
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3. Aprende o que não deves dizer
Comentários como “só tens de relaxar”, “pelo menos abortaste cedo”, “de quem é a culpa?” ou “a minha amiga engravidou naturalmente após 4 rondas de FIV” não ajudam. Tenta não oferecer conselhos não solicitados.
Podemos ter a melhor das intenções, mas perguntar a alguém quando vai ter um bebé nunca é uma boa ideia, ponto final.
A menos que alguém esteja a partilhar essa informação de sua livre e espontânea vontade, esse tema não tem nada a ver connosco.
Regra geral, um casal ou não tem filhos porque não quer (e aqui os motivos podem ser vários: não se reveem nesse papel, sentem que ainda não é o momento etc.) ou porque até estão a tentar, mas ainda não aconteceu.
Não conheço ninguém que não tem filhos porque se “esqueceu” de discutir essa possibilidade. Não é um tema que se esquece. Portanto, se a nossa ideia é lançar essas perguntas para funcionar como um lembrete, é só parvo. Se não temos nada para dizer, falemos do tempo, de séries, de futebol!
4. Perdoa-os
Perdoa a ausência deles. Perdoa-os se deixarem de dar notícias e desaparecerem do mapa durante algum tempo. Perdoa-os se nem sempre perguntam como está a correr a gravidez. Perdoa-os se nem sempre pedem fotografias do teu bebé. Perdoa-os se não quiserem ir ao baby shower do teu bebé.
Este tipo de eventos pode causar muita dor emocional. Eles estão apenas a tentar lidar com a situação e sobreviver, por isso, perdoa-os.
5. Apoia as suas escolhas de estilo de vida
Se te disserem que decidiram deixar de beber álcool, cortar no glúten, jogar futebol, comer mais ovos – simplesmente apoia-os e não os questiones. As pessoas tentarão de tudo para ter um filho e não precisam do stress adicional de justificar o que estão a fazer a quem quer que seja.
6. Mostra que estás lá para eles
Eles podem gostar que os leves a dar uma volta. Podem querer que te sentes com eles num evento como um baby shower ou um casamento. Ou podem apenas querer que tragas uma garrafa de vinho e lhes faças companhia para relaxarem e se divertirem um pouco na tua companhia.
Conclusão
Em suma, falar sobre infertilidade pode ser desconfortável, mas mesmo aquelas perguntas mais básicas podem ser uma boa oportunidade para te conectares com a tua amiga e criares espaço para que ela se possa abrir, se assim o desejar.
Não deixes que o medo de dizer a coisa errada te impeça de ser uma boa amiga. No final das contas, saber simplesmente ouvir é um dos presentes mais poderosos que tu lhe podes dar.
Fundadora do projeto Mães às Claras